Guia do Draft para Iniciantes

Por Érica Barros

O Super Bowl é o ápice da temporada da NFL, um dos maiores acontecimentos esportivos que temos todos os anos. É o momento que muita gente conhece a NFL e começa a se interessar pelo esporte. O futebol americano segue crescendo no Brasil, o que quer dizer que sempre aparecem fãs novos que ainda não entendem tudo que engloba a NFL – que não são apenas os jogos, tem muita coisa nos bastidores. 

Um assunto que muitas vezes gera dúvidas é o Draft, já que aqui no Brasil não existe um evento semelhante. Por esse motivo, resolvemos desenvolver esse texto tentando responder algumas dúvidas bem recorrentes nas nossas redes sociais, montando basicamente um guia do Draft para iniciantes.

Foto: Kirby Lee/USA TODAY Sports

O que é o Draft?

O Draft é um evento anual organizado para a alocação de atletas em times da liga profissional que o organiza. O processo é realizado em diversos países e nos Estados Unidos todas as ligas principais realizam: NFL, NBA, WNBA, NHL, MLB, MLS, entre outras.

No caso da NFL, que é nosso foco, é um evento onde os 32 times da liga escolhem jogadores de futebol americano, em sua grande maioria advindos de universidades. É a forma mais comum de recrutamento de jogadores da liga.

O evento dura três dias, tem sete rodadas e disponibiliza até 256 escolhas para os times – 32 escolhas por rodada e mais 32 escolhas compensatórias, que trataremos mais adiante.  

Quando e onde será o Draft de 2020?

O 85º Draft da NFL ocorre entre os dias 23 e 25 de abril de 2020. O evento de três dias seria realizado em Las Vegas – porém, por conta da pandemia do Coronavírus, o Draft será conduzido digitalmente e sem aglomeração de pessoas. Ou seja, não teremos as famosas salas de guerra (war rooms), salas onde os técnicos, general managers, donos e outros funcionários das franquias se reúnem para acompanhar o evento, decidir suas escolhas e trocas. 

No primeiro dia (23) ocorre a primeira rodada do Draft, no segundo (24) as rodadas 2 e 3, e no último dia (25), as rodadas 4 à 7 encerram o evento. O Draft da NFL de 2020 terá transmissão da ESPN Brasil.

Quem pode ir para o Draft? Como um jogador fica elegível para o Draft? Apenas quem jogou em universidades americanas podem entrar no Draft?

Basicamente, jogadores que já completaram três anos fora do high school estão elegíveis para o Draft – ou seja, a partir do terceiro ano de universidade, o jogador pode entrar no Draft.

Nenhuma regra diz que o jogador obrigatoriamente precisa passar pela universidade ou que precisa jogar futebol americano nesses três anos, porém teoricamente todos os jogadores são advindos de universidades americanas (ou canadenses) e praticaram o esporte – em alguns casos, jogadores de outros esportes são escolhidos no Draft: Antonio Gates, por exemplo jogou basquete universitário.

Jogadores que não são estadunidenses ou canadenses também podem participar do Draft. Muitos estudaram em universidades desses países e seguem o caminho “comum”. Porém, existem casos de jogadores internacionais que não jogaram em universidades e que também entraram na NFL pelo Draft. Em 2016, o Minnesota Vikings escolheu o tight end alemão Moritz Böhringer, o primeiro jogador “estrangeiro” escolhido no Draft que não passou pelo futebol americano universitário. Böhringer jogou na Liga Alemã de Futebol Americano entre 2013 e 2015. O jogador chamou a atenção de olheiros, que o convidaram para participar do Pro Day (mais sobre isso adiante) da Florida Atlantic University em 2016.

Foto: Brace Hemmelgarn/USA Today Sports

Atualmente, o caminho “mais fácil” para jogadores que não passaram pelo futebol americano universitário é o International Player Pathway, que é um programa promovido pela NFL que busca aumentar o número de jogadores que não sejam estadunidenses ou canadenses. Foi pelo IPP que Duzão entrou na NFL.

Quantas escolhas tem no Draft? Quantas escolhas cada time tem? O que é escolha compensatória e como ela é distribuída?

O Draft da NFL pode ter até 256 escolhas.

Cada time tem, inicialmente, uma escolha por rodada – ou seja, uma rodada tem 32 escolhas. O Draft da NFL tem sete rodadas. Além disso, a liga distribui 32 escolhas compensatórias entre os times que mais perderam do que ganharam free agents e jogadores “importantes”, que têm um alto valor no mercado. A distribuição dessas escolhas compensatórias é feita a partir de uma fórmula que a NFL nunca tornou pública, mas que se baseia em: salário, tempo de jogo, entre outros. Cada time pode receber, no máximo, quatro escolhas compensatórias. 

Portanto, cada time começa o processo do Draft com, no mínimo, sete escolhas cada. Por que frisar que os times começam com, no mínimo, sete escolhas cada?

As escolhas do Draft podem ser utilizadas como moeda de troca em negociações entre os times durante a temporada e offseason – essas trocas podem ocorrer também durante o Draft. Em 2020, o Miami Dolphins é o time com mais escolhas, 14 (sendo três só na primeira rodada); enquanto New Orleans Saints e Kansas City Chiefs são as franquias com menos escolhas, apenas cinco cada um.

A ordem do Draft é definida pela classificação final: o time com pior campanha tem a primeira escolha da rodada enquanto o vencedor do Super Bowl tem a última. 

Assim, em comparação entre a classificação final e a ordem do Draft é: 

Se algum time estiver mais de uma vez na lista de alguma rodada do Draft, ou se não aparecer, calma! Provavelmente vá ter uma observação explicando que o time trocou sua escolha com outro.

É possível perder ou desistir das escolhas no Draft: como punição por parte da NFL ou pelo Draft Suplementar (mais a seguir). Desde 1980, 21 escolhas foram retiradas de 11 times – exemplos famosos são os Patriots com o Deflate Gate e os Saints com o Bounty Gate.

Em 2020, teremos um total de 255 escolhas, já que o Arizona Cardinals utilizou uma escolha no Draft Suplementar. 

O que é o Draft suplementar? 

O Draft suplementar é uma segunda oportunidade para jogadores que tiveram problemas com sua elegibilidade para o Draft “normal” – sejam esses problemas questões de perda de prazos ou acadêmicos e disciplinares. Um jogador não pode propositalmente perder o primeiro Draft para ir para o suplementar. Exemplos atuais são: o wide receiver Josh Gordon foi escolhido no Draft suplementar de 2012, o qual ele participou após problemas disciplinares no college; em 2018, os cornerbacks Sam Beal e Adonis Alexander participaram do Draft suplementar após serem considerados inelegíveis academicamente em suas faculdades.

Os times não são obrigados a participar do Draft suplementar, mas aqueles que querem, precisam “apostar” a rodada em que escolheriam o jogador em uma situação normal – caso não haja outros concorrentes, o time leva o jogador e perde a escolha do Draft do ano seguinte na rodada que apostou. Caso mais de um time queira o mesmo jogador, os dois apostam e vence quem apostar a rodada mais alta. 

No Draft suplementar de 2019, o Arizona Cardinals escolheu o safety Jalen Thompson apostando sua escolha de 5ª rodada. Então, no Draft de 2020, o time não terá a escolha desta rodada. Os Cardinals foram os únicos a participar.

Como funciona o Draft assim que o cronômetro inicia? Passo a passo.

Caso não estivéssemos em um momento de pandemia, no dia 23 de abril de 2020, em Las Vegas, seria dito que Draft está oficialmente aberto e que o Cincinnati Bengals “are on the clock” – o que quer dizer que a contagem regressiva de 10 minutos iniciou e que o time tem este tempo para decidir e anunciar sua escolha. O processo seria o seguinte:

Assim que o Cincinnati Bengals decidir qual jogador irá escolher, a ‘sala de guerra’ do time informa seus representantes em Las Vegas. A escolha será então escrita no tradicional cartão do Draft e entregue a um membro do staff da NFL conhecido por runner, que, por sua vez, notifica que a escolha foi feita. Nesse momento, a escolha está feita. A pick é colocada na database que a NFL e todos os times dividem, informando à todos quem foi a primeira escolha do Draft de 2020. Então, a informação chega até Roger Goodell, que irá anunciar que: com a primeira escolha do Draft de 2020, o Cincinnati Bengals seleciona jogador X (provavelmente Joe Burrow, quarterback de LSU).

Foto: Ronald Martinez/Getty Images

A partir de então, o processo se repete. Mesmo com as mudanças, o tempo de escolha segue o mesmo: durante a primeira rodada, os times têm até 10 minutos para exercer sua escolha, na segunda rodada passa para 7 minutos, entre as rodadas 3 e 6 são 5 minutos e na sétima rodada apenas 4 minutos. 

E quem não foi escolhido? O que acontece?

Não ser escolhido no Draft não é o fim da carreira de um jogador de futebol americano. Além de outras ligas, como a CFL por exemplo, os jogadores ainda têm chances na NFL. Conhecidos como undrafted free agents, os jogadores que passaram pelo Draft sem ter seu nome chamado podem assinar com qualquer time da liga. Não existe um limite de quantos undrafted free agents um time pode contratar. 

Após assinar contrato com o time, cabe ao jogador impressionar durante o training camp para seguir na liga. Alguns nomes importantes que entraram na NFL como undrafted free agents são o quarterback Tony Romo (DAL),  o linebacker James Harrison (PIT), o kicker Adam Vinatieri (NE). Atualmente, o running back Phillip Lindsay pelo Denver Broncos e o wide receiver/return specialist Deonte Harris pelo New Orleans Saints se destacaram.

Como os times conhecem os jogadores antes do Draft?

Além de ser cada vez mais fácil seguir a carreira de um jogador desde seus tempos de high school, as franquias têm setores especializados em acompanhar aqueles que interessam ao time: os scouts, que podemos traduzir para olheiro. Além disso, existem eventos onde os jogadores mostram suas habilidades: o Combine e os Pro Day. 

O Combine é um evento que ocorre durante seis dias no Lucas Oil Stadium, estádio dos Colts, em Indianápolis no estado de Indiana. Jogadores de futebol americano são convidados a participar de diversos testes físicos e mentais em frente a técnicos, general managers e olheiros. O Pro Day é muito semelhante ao Combine, a única diferença é que é realizado nas universidades – o que pode ser muito bom para os atletas pela familiaridade e aconchego de realizar tais testes em sua “casa”.

Foto: Joe Robbins/Getty Images

Ainda existem as visitas pré-Draft. Os times da NFL podem levar até 30 jogadores elegíveis para suas dependências e realizar testes semelhantes ao do Combine, além de entrevistas. Jogadores que estão em universidades da área do time ou que são nativos da área não contam entre esses 30 atletas. Esse ano, por conta do Coronavírus, não foi possível realizar tais visitas.

O jogador escolhido no Draft é obrigado a ficar no time que o escolheu?

O jogador não é obrigado a ficar no time que o escolheu no Draft. O que o time e jogador decidem fazer vai depender da situação: em caso de escolhas mais altas, normalmente o time que escolheu o jogador procura uma troca que vá “ressarcir” sua perda; em caso de uma escolha baixa, o jogador pode apenas ser cortado.

O caso mais lembrado é o do quarterback Eli Manning em 2004. Ele já era considerado como certeza na primeira escolha pelo, na época, San Diego Chargers – porém, dias antes do Draft, o agente do futuro bicampeão do Super Bowl disse que Manning iria se recusar a jogar pelos Chargers caso fosse escolhido pelo time, afinal os Chargers tinham apenas quatro temporadas com mais vitórias que derrotas em vinte anos.

Foto: Chris Trotman/Getty Images

Porém, mesmo contrariando o desejo de Eli, o San Diego Chargers o escolheu na primeira escolha geral do Draft de 2004. O quarterback posou para fotos com a jersey do time da Califórnia, mas nos bastidores, os Chargers já haviam acertado uma troca com o New York Giants, na qual eles escolheriam o quarterback Philip Rivers na quarta escolha geral e o trocariam (mais uma escolha de terceira rodada em 2004 e duas escolhas no Draft de 2005) por Eli Manning. .

Não foi apenas Eli que recusou jogar pelo time que originalmente o escolheu. John Elway, quarterback, foi a primeira escolha geral do Draft de 1983 pelo Baltimore Colts e se recusou a jogar pelo time. Ele ameaçou desistir da promissora carreira que teria na NFL para jogar baseball caso fosse escolhido pelo time de Baltimore e, eventualmente, foi trocado para o Denver Broncos.

O salário das escolhas do Draft contam no salary cap? Como é definido o salário e contrato dos jogadores?

O salário dos calouros contam no salary cap. Cada time tem um valor “separado” para pagar suas escolhas no Draft, que não é o mesmo entre as franquias. O salário mínimo de um rookie na NFL em 2020 é de US$610 mil. O salário dos jogadores é definido em negociação com o time mas com base em qual posição foram escolhidos.

Basicamente, os contratos para os rookies draftados são de quatro anos, com variação de valores, mas respeitando o mínimo. Porém, as escolhas de primeira rodada têm em seu contrato a opção de quinto ano, que permite aos times manterem os direitos sobre o jogador por mais um ano, caso queiram – sendo então recalculado o salário. Os contratos das dez primeiras escolhas do Draft são significativamente maiores que as demais. 

Como dito anteriormente, procuramos responder algumas das dúvidas que surgiram em nossas redes sociais, mas se você ainda tem alguma pergunta, deixe-a nos comentários que responderemos.

3 Responses
  1. Hugo

    Uma dúvida: os salários dos calouros são definidos pelo acordo trabalhista da NFL com NFLPA?? Ou é um “acordo” coletivo entre os times pagar X de acordo a posição de escolha???

    1. Érica Pires Barros

      Oi! O salário mínimo é definido pelo acordo trabalhista sim, mas de resto é uma negociação entre o jogador e o time. Aqui tem a projeção do Spotrac para os valores dos contratos =) https://www.spotrac.com/nfl/draft/

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